quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

ENTREVISTA COM RYOKI INOUE, RECORDISTA MUNDIAL DE LIVROS ESCRITOS E PUBLICADOS











Quando conhecemos Ryoki Inoue, para nós era apenas um editor e escritor. Recordista mundial de livros escritos e publicados, mas apenas um editor. Foi assim, que eu o conheci, mais ou menos 11 anos atrás. A vida nos afastou por motivos diversos, e quase esquecemos, um do outro.
Minha lembrança do Ryoki sempre foi uma foto que vi não sei onde, (ou um programa de TV, não sei bem) ele, sentado a uma escrivaninha, com uma máquina de escrever eletrônica, de onde saía uma folha contínua de papel que vinha de uma caixa de formulário contínuo, passava pelo rolo da máquina, e dali, saía o livro. Como uma linha de produção.
À sua frente, havia uma estante, com suas obras... Todas arrumadinhas, um mundo de livros!
Ryoki consegue ser mais que um escritor. Consegue nos passar sentimento, no papo informal, e isso, para quem trabalha com literatura, para quem respira literatura, como é o caso dele, é um dom a mais.
Raramente, um escritor desse porte, tem temperamento fácil. Ryoki não é exceção. Sua mania de perfeição irrita às vezes, mas é para o bem do texto escrito, e para o bem da reputação de quem escreve.
Considero-me, hoje, seu amigo. Mais que isso: procuro aprender, a cada minuto que passo, no micro, com este rabugento senhor das letras.
Conviver com Ryoki é, necessariamente, entrar em seu ritmo. Ou você adora o papo com ele, ou detesta. Não há meio termo!
É um verdadeiro escritor, na essência da palavra.
Ele tem a humildade de receber críticas, mas é feroz e mordaz nas que faz...
Aprendi a entender suas críticas e a aceitá-las, pois nelas sempre vem o ensinamento, a visão da experiência com as letras, com o conhecimento literário e editorial.
Fico honrado com a sua amizade e, mais do que isso, ele honra este nosso Jornal, permitindo-nos entrevistá-lo na informalidade do papo sem compromisso, a não ser um compromisso com o conhecimento deste brasileiro, que o Destino levou para o ramo dos livros e que, com a sua força de vontade, com seu sistema único de organizar o tempo, e racionalizar o trabalho, o fez tornar-se único.



1 ) Ryoki, o que você pensa do mercado editorial brasileiro?
Acho que poderia dizer que é um mercado extremamente cruel. Hoje é assim. Algumas décadas atrás, as coisas eram diferentes, uma vez que existia mais sensibilidade por parte dos editores. Atualmente, a preocupação é o ganho, o lucro. Não se pode condenar esse tipo de pensamento num mundo como o de hoje. Porém, acho que isso está um bocado exagerado... Além do mais, os editores costumam não dizer exatamente a verdade nas entrevistas que dão e, pior, eles têm o péssimo hábito de dourar a pílula que estão vendendo para a opinião pública. Assim, por exemplo, é voz corrente entre os editores que há mais livros publicados de autores nacionais do que de estrangeiros. Isso não é uma verdade perfeita, especialmente se tomarmos os diversos gêneros literários. Assim, no gênero ficção (romances, de um modo geral), os autores brasileiros são minoria. Há muitos mais autores estrangeiros, resultados de negócios realizados “em pacotes” nas grandes feiras internacionais de literatura e mesmo em transações feitas a qualquer tempo, em qualquer lugar deste mundo globalizado. Além disso, as fusões/aquisições de grandes editoras brasileiras por outras estrangeiras – notadamente espanholas, italianas e francesas – fizeram jorrar no mercado editorial tupiniquim uma imensa quantidade de originais “de fora”, cujas qualidade literária e conveniência relativa ao público brasileiro são bastante discutíveis, que ocuparam o espaço editorial que, teoricamente, deveria estar sendo ocupado por autores nacionais. Há quem jogue a culpa desse estado de coisas no próprio leitor brasileiro, dizendo que é idéia comum a todos eles o famoso ditado “santo de casa não faz milagre”. Não é verdade. O grande problema é que o “santo de casa” necessita de marketing, de grande e pesada divulgação e de distribuição adequada. E isso custa dinheiro. Um dinheiro que os editores receiam não ver o famoso ROI (Return Over Investment). O “santo de casa” faria milagre, sim, se para ele acendessem-se a quantidade certa de velas... Porém, só alguns têm esse privilégio. Se procurarmos acompanhar os lançamentos de livros (de ficção, estamos falando desse gênero, não esqueça) no Brasil, veremos que apenas uma ou duas dezenas de autores nacionais são privilegiados e, efetivamente prestigiados pelas editoras ditas “de porte”. Há que se considerar, contudo, um outro fator importantíssimo. A distribuição. E entenda-se, aqui, um aspecto um pouco mais amplo, o que significa que o livreiro, o intermediário imediatamente antes do leitor, está sendo considerado “na mesma panela”. Assim, um autor nacional, a menos que já esteja amplamente consagrado, sempre é recebido pelo distribuidor com o nariz torcido. Ele não pega mais do que algumas poucas dezenas de exemplares e, quando vai apresentar o produto para as livrarias, isso é feito bem depois de uma boa dezena de livros de autores estrangeiros. O resultado é previsível: o livreiro compra estes em primeiro lugar e, se sobrar intenção (leia-se “verba”), no máximo cinco exemplares do nosso conterrâneo serão adquiridos. E sempre em consignação. Essa mesma linha de raciocínio inviabiliza negócios para as editoras menores que, estas sim, têm em seus catálogos muito mais autores brasileiros do que estrangeiros, mesmo porque o acesso dessas editoras a grandes transações editoriais – em Frankfurt, por exemplo – é bem mais complicado. No caso dessas editoras menores, que dependem intrinsecamente de um bom sistema de distribuição para que seus títulos sejam aceitos pelos livreiros e que não possuem sistemas próprios de distribuição e disseminação de seus catálogos, o custo é muito alto, chegando à quase inacreditável marca dos 65% do preço de capa. Dessa maneira, se considerarmos esse números e mais alguns outros – o custo gráfico costuma ser de 20% do preço de capa e os direitos autorais, 10%, sem contar impostos e coisas tais – o que sobra, efetivamente para a pequena editora? Por tudo isso, digo que o mercado editorial brasileiro é cruel. Cruel para todos, talvez com exceção das grandes editoras e das grandes redes de distribuição.

2) Existem falhas graves, a serem corrigidas, no mercado editorial brasileiro?
Evidentemente. Aliás, como em qualquer mercado. Porém, justamente por ser um mercado muito sui generis, o editorial deixa suas falhas mais visíveis, especialmente para os principais fornecedores que são, no resumo da ópera, os escritores. Talvez o principal erro que teria de ser corrigido seja a maneira de pensar dos editores. Essencialmente, a editora existe porque produz livros. E esses livros só poderão ser produzidos se houver autores. Logicamente, isso significa que as editoras precisam dos autores. Contudo, não é o que se percebe... A impressão que qualquer autor brasileiro tem ao se entrevistar com um editor é que este está lhe fazendo um favor imenso em recebê-lo e que é um verdadeiro milagre, motivo de festa regada a uísque e champanhe, quando o original é aceito. Sim, pois isso quando o original consegue chegar às mãos do gerente editorial... Na maioria das vezes, isso não acontece e o trabalho de meses – quando não, anos – de um escritor, vai sumariamente para o lixo sem sequer ter sido lido, ou então é devolvido – também sem ser lido, já vi casos de autores que mandaram os originais propositadamente com as páginas coladas e eles foram devolvidos da mesma maneira – com uma cartinha-padrão dizendo que “apesar da inegável qualidade da obra, não temos vaga para os próximos dois anos”... Ao contrário do que deveria ser, o autor é quem tem a importância menor na escala produtiva de um livro.

3) Há quem diga que quem escreve livros, no Brasil, ou é maluco ou fanático por ter obras inéditas na gaveta. O que você diz disto?
Você esqueceu uma outra característica e, esta sim, muito importante: o vaidoso. E digo que é importante porque é este tipo de escritor que, na realidade, pode ser considerado o grande culpado pelo modo de pensar dos editores, em especial, os “grandes”. Vou tentar justificar... Reclamamos, por exemplo, que os “advanced” pagos – e quando existem – pelas editoras aos autores são muito baixos. E, de fato, o são, especialmente se comparados com aqueles pagos nos Estados Unidos, na França ou na Inglaterra. Da mesma maneira, reclamamos que as prestações de contas sobre os direitos autorais somente são feitas depois de seis meses... e quando são feitas. Em ambos os casos, isso se deve a um hábito que foi implantado nas editoras pelos próprios autores. A imensa maioria dos autores brasileiros não precisam nem mesmo pensar em sobreviver de direitos autorais. Nem ligam para isso. Para eles, basta-lhes saber que sua obra foi aceita, editada e publicada por uma “grande” editora. Ter seu nome no catálogo de uma delas é, para eles, um troféu conquistado, uma comprovação de competência, uma prova de reconhecimento. Na verdade, nada mais do que um alimento para a sua vaidade intelectual. Assim, as editoras acabaram por se acostumar a publicar obras de autores que vêem satisfeita a necessidade de inflar o ego antes mesmo de inflar, nem que seja minimamente, o bolso... Nós, escritores profissionais, aqueles que literalmente vivem da mão para a boca, precisamos de um pouco mais do que isso. Na realidade, precisamos antes de inflar o estômago e, depois, bem depois, o ego. A massagem na vaidade será uma conseqüência e não um motivo primário. Contudo, não acho que seja maluco ou fanático por originais engavetados aquele que decide escrever livros no Brasil. Ou em qualquer parte do mundo. Ser escritor é, no fundo, mais uma profissão e que exige não apenas dedicação, mas muita vontade para continuar a sê-lo. E é preciso que se distinga com bastante clareza algumas subdivisões dentro dessa gama de profissionais. Assim, temos – como você mesmo disse – os “malucos”. Vamos perguntar: malucos, por quê? Pode ser simplesmente porque são iludidos que acham sempre que conseguirão sobreviver só com o que escrevem? Pois acho, sinceramente, que não são tão malucos assim. Eu mesmo sobrevivo do que escrevo... Há, portanto, essa possibilidade. É preciso, no entanto, que se trilhe o caminho certo. É preciso que não se tenha vaidade e, bem ao contrário, é fundamental ter a humildade de deixar que seu texto seja “trabalhado” por um profissional do ramo no sentido de se poder extrair dele o que é realmente bom e “comerciável”, deixando que seja eliminado – ou substituído – aquilo que, no fundo, não passa de elucubração de escritor, por mais que este queira dizer que “justamente isso é a essência” de sua alma. Há outros “malucos” que querem pôr para fora seus fantasmas interiores e esquecem que esses fantasmas são tão interiores que ninguém mais, além do próprio autor, consegue compreendê-los ou, ao menos, interessar-se por eles. A menos que haja um nome e sobrenome de vulto assinando a obra, esta jamais passará além de ser um grande, um imenso “Incômodo”... Já aqueles que você classificou como “fanáticos por obras engavetadas” só estão nessa categoria por dois motivos. Primeiro, porque são tímidos e não têm coragem de chamar um profissional para uma avaliação correta da qualidade de seu texto ou, são excessivamente vaidosos para ouvirem um “não” de um editor. Assim, depois de tudo o que disse – e para não me alongar mais ainda – não posso concordar com quem diz que, o Brasil, o escritor é maluco ou um colecionador de obras engavetadas. Ser escritor é uma profissão e, digo mais, uma profissão nobre e necessária, pois se não fosse pela existência de quem escreve, de quem põe suas idéias e sua produção intelectual a tapa, não haveria a disseminação da cultura, tão necessária para o crescimento dos povos.

4) A que fato, você atribui o não investimento das editoras de renome, em autores desconhecidos? Elas não estariam perdendo um filão de mercado muito promissor?
Uma editora é uma empresa e, num mundo capitalista como o atual – aliás em muitos pontos, capitalista selvagem, ela não pode deixar de pensar que a finalidade última de qualquer empresa é o lucro. O problema está no fato de as empresas-editoras pensarem exclusivamente no lucro máximo. O maior ROI possível. Não podemos condená-las. Mas bem que poderia haver um pensamento mais “light” do ponto de vista financeiro e as editoras pensarem um pouco mais carinhosamente na disseminação da cultura... Se esse pensamento, de fato, existisse, muito lixo estrangeiro deixaria de ser publicado aqui no Brasil e haveria, com certeza, mais espaço editorial para obras de autores tupiniquins que mereceriam estar nas prateleiras das livrarias. E que não estão única e exclusivamente porque elas não são “cartas marcadas”, ou seja, “aposta ganha”. Diga-se de passagem que eu já vi, pessoalmente, com estes olhos que a terra há de comer, editoras “grandes” publicarem obras traduzidas, falsos “best-sellers”, verdadeiros lixos que já passaram, já caíram de podre no exterior muitos anos antes, mas que tinham sido adquiridos por essas editoras e que precisavam ser “desovados”. Então, valia fazer de tudo, inclusive comprar espaço em veículos de comunicação com “matérias-jabá” para divulgar porcaria. E vender. Eu mesmo fui contratado para criticar duas obras desse gênero... Claro, não gostaram das críticas simplesmente porque fui autêntico, verdadeiro, honesto. A filosofia mercantilista do lucro máximo teria de dar ao menos um pouco de lugar para uma filosofia de mercado editorial que propiciasse mais oportunidades para o autor nacional. E não se trata de autor desconhecido... Por incrível que possa parecer, basta o nome ser estrangeiro. Quem conhece o autor de policiais Woodrow McDonald? Ninguém, aposto. Mas ele vendeu nada menos que 15 mil exemplares de seu livro “Piratas do Rio”, enquanto, pela mesma editora, um outro autor, este de nome bem brasileiro – que não vou citar para não criar constrangimentos – não conseguiu vender nem 2 mil... Culpa de quem? Possivelmente do próprio leitor, que acredita mais na qualidade do que escreve um estrangeiro. Então, as editoras praticamente se vêem obrigadas a publicar autores como o McDonald e deixar de publicar um João Ninguém, mesmo que este último tenha uma qualidade literária muito maior do que o primeiro. Uma questão de possibilidade de lucro, que temos de entender, muito embora seja difícil de aceitar. Usando as palavras de Isa Pessoa, na época a responsável pela escolha de autores nacionais para a Editora Objetiva, “Muitos originais chegam aqui num padrão que não é o de publicação. Lá fora, essa peneira inicial já está feita.” Justamente por isso é que reitero o que já disse antes: o autor nacional precisa entender que é fundamental contratar um profissional para preparar sua obra antes de se arriscar a apresentá-la a uma editora. Especialmente se for uma editora daquelas ditas “de porte”. A maioria dos escritores tupiniquins não pensa em comparar – no quesito “apresentação” – a sua obra com a de um concorrente estrangeiro. Esta, já por ter sido negociada de editora para editora ou de agente para editora, ambos os casos uma negociação típica B2B (Business to Business, para os ainda não-iniciados), o material adquirido vem praticamente pronto. Já no caso dos nossos conterrâneos, estes acham que interessa simplesmente o conteúdo, a apresentação do material devendo ser relegada a um segundo plano. Ledo engano, meu amigo! É mais do que evidente que o gerente editorial vai ler com mais boa-vontade um original apresentado corretamente, já devidamente revisado e “copydeskado” do que um outro, ainda cru. Mesmo que o conteúdo deste último seja infinitamente superior, do ponto de vista literário, ao do o9utro,bem arrumado, bem apresentado, com um projeto literário incluído, com sinopse, argumento e estudo dos principais personagens. Mais uma vez, uma questão de custos... E o tempo, sem a menor dúvida, é fator de custo muitíssimo importante. Leva mais tempo analisar um texto cru do que um bem elaborado.

5) As livrarias de pequeno porte, hoje são raridades. Passaram a ser Mega lojas, com livros, e outros atrativos. Isso, não levou a cultura, para um restrito endereço: só as grandes cidades?
Não acho, em primeiro lugar, que a quantidade de livrarias possa ser um termômetro da cultura de um país. Segundo, nada tenho contra as “Megastores” em que se transformaram as livrarias atuais. A tendência é essa: os grandes absorvem os pequenos, num processo de fagocitose que, segundo penso, é irreversível. Pelo menos durante as próximas décadas. Depois, talvez aconteça o retorno ao status quo ante, mesmo porque tudo é cíclico neste mundo. Terceiro, com o advento da Internet, acho que não pode haver a desculpa de não se ter cultura disseminada por todas as partes deste país. Basta um clique e estaremos diante de bibliotecas, de museus e coisas tais. É mais fácil comprar livros via Internet do que ir a uma livraria, enfrentando trânsito, possibilidade de assaltos, etc. Um homem como você, com o seu Anacoluto, é um disseminador de cultura mais importante do que muitas livrarias. E tanto faz o seu leitor estar na casa vizinha à sua, como em São Paulo, Tóquio, Nova Iorque, Manaus, Santarém ou numa aldeia de índios no meio da Amazônia, mas que disponha de acesso à Internet via satélite. As “Megastores” não atrapalham e nem concentram a disseminação da cultura. Pode apostar nisso.

6) Você é, essencialmente, um homem de livros... Um homem de Cultura... O Brasil possui um bom nível cultural, se comparado com Portugal, ou outro país de língua portuguesa?
Creio que são parâmetros completamente diferentes. Portugal é muito mais antigo que o Brasil e o Brasil é mais antigo – como país – do que Angola ou Moçambique. Não dá para comparar. Seria o mesmo que querer comparar um Chablis produzido na Califórnia e um outro, idêntico, produzido na França. Este último terá sempre a diferença de ter nas costas 2 mil anos de civilização. A cultura brasileira é herança da portuguesa. Muitos escritores brasileiros de dois séculos atrás foram extremamente influenciados pelas escolas lusitanas. Muito de nossa cultura, ainda hoje, tem nítidos reflexos da cultura de Portugal. O Brasil tem, sim, um bom nível cultural. Assim como Portugal, Timor Leste, Angola, Moçambique... Mas cada um na sua...

7) Você acredita que ainda exista, no Brasil, espaço para o surgimento de um escritor com potencial internacional, que ainda não foi descoberto por editoras nacionais?
Sim, acredito. E esse surgimento, na verdade, depende quase que única e exclusivamente da boa-vontade e capacidade de negociação das editoras brasileiras quando nas feiras internacionais e mesmo durante o resto do tempo. Teria de haver um pouco mais de “filosofia de venda de autores brasileiros” do que a simples e modorrenta “filosofia de compra de autores estrangeiros”. Precisamos nos libertar do jugo intelectual do hemisfério norte, que diabo! Temos grandes valores, com grandes potenciais de vendas internacionais aqui, além do Paulinho (Paulo Coelho)...

8) Qual o escritor brasileiro, na atualidade, que você destacaria como excepcional?
Já disse. Paulo Coelho, no que pese a crítica não concordar. Paulo Coelho tem um mérito que ninguém pode negar: ele ensinou o brasileiro a comprar livros. Além disso, ele descobriu – e está explorando muitíssimo bem – um nicho literário que é extraordinário em todo o mundo e não apenas no Brasil. O povo gosta de ler Paulo Coelho. Não interessa se ele é profundo – não tem a obrigação de ser – e não interessa o fato de não ser erudito – ele não precisa ser. Aliás, quem vende 45 milhões de exemplares em um ano, não precisa provar coisa nenhuma a ninguém.

9) Na sua opinião, a internet pode se tornar uma grande livraria?
Hoje em dia a Internet já é um dos meios de comunicação e vendas mais importantes do mundo. Todas as médias e grandes livrarias já possuem um sistema de busca e de vendas através da Internet. Outros sites vendem livros, assim como vendem quaisquer outras mercadorias. Portanto, a Internet já é uma grande livraria. E com a vantagem de o cliente não precisar sair de casa ou do escritório para fazer uma compra.

10) Se fosse hoje o dia de começar a escrever seu primeiro livro, você escreveria pensando numa edição em papel, ou numa edição em mídia diferente, como um CD?
Certamente pensaria num CD. E em primeiro lugar porque o CD é muito mais ecologicamente correto. Não é preciso derrubar uma só árvore para se produzir e vender um livro. Segundo, porque estaria livre da escravidão imposta pelas editoras e livrarias. Terceiro porque, para o leitor, ocupa muito menos espaço do que os livros em papel. Quarto, porque o produto final ficaria muito mais barato. Quinto, porque está acontecendo uma tendência mundial – veja-se a última feira de Frankfurt – para as chamadas mídias alternativas e seus surpreendentes aparelhinhos de leitura.

11) Porque pensa que livros em Cd, é o futuro? Isso não fere o comércio editorial de hoje em dia, todo voltado ao papel?
Acho que expliquei na resposta anterior. E acho, também, que os conceitos do comércio editorial voltado para as publicações em papel terão de mudar. Há o aquecimento global, as destruições de florestas, o conceito ecológico, a praticidade, a falta de espaço... Tudo leva ao livro eletrônico. O CD é uma mídia que está sendo pensada e avaliada. Mas outros sistemas surgirão e eu quero estar “fazendo a esteira”...
12) Você é recordista mundial, em livros editados. Isso mudou sua vida, ou o colocou com mais responsabilidades e sem o devido retorno?
Não posso dizer nada a respeito do retorno. Claro que poderia ser muito melhor, especialmente se eu estivesse escrevendo nos Estados Unidos, por exemplo. E talvez se não tivesse sido obrigado a usar meu nome japonês, pois existe, sim, um forte preconceito. Mas esse recorde não mudou minha essencialmente a minha vida. É claro que muitas portas se abrem com mais facilidade, é claro que sou respeitado no meio intelectual... Por outro lado, há muitos pseudo-intelectuais que desprezam, dizendo que quantidade e qualidade são duas coisas que não se casam. Discordo totalmente e já cansei de dizer a essas pessoas que leiam antes de julgar. Mas infelizmente, la critique est facile, mais l’art es difficile. E esses pseudo-críticos, simplesmente não têm a arte...

Sem a menor sombra de dúvida. Com certeza, eu teria feito muita coisa de forma diferente. Teria, por exemplo, procurado um agente literário e um consultor literário. Certamente teria “pastado” menos.

13) Que conselho você daria a um escritor que estivesse querendo ingressar, hoje, no mundo e no mercado editorial brasileiro?
Em primeiro lugar, aconselho-o a levar em consideração que o mundo editorial brasileiro recebe, todos os anos, mais de 40 mil originais de autores iniciantes. Desses, apenas 1% são aproveitados. Portanto, o que o faz pensar que seu original estará dentro dessa porcentagem ínfima? Porém, ele quer entrar nesse mercado... Para isso, é fundamental que:
a. O escritor faça um bom planejamento antes de começar efetivamente a escrever o texto
b. Planeje o texto e a narrativa
c. Planeje e “amarre” bem o enredo e a trama
d. Estude e construa corretamente os personagens, pelo menos os principais
e. Pesquise sobre a época e o local que pretende dar como pano de fundo para a sua trama
f. Escreva gramatical e ortograficamente certo
g. Saiba com exatidão o público-alvo que pretende atingir
h. Saiba qual ou quais editoras têm o perfil necessário e suficiente para aceitar, publicar e distribuir sua obra
Se você tiver dúvidas quanto ao absoluto e perfeito domínio sobre os itens acima enumerados, por favor, contrate um consultor literário. Pode dispor de mim, através do e-mail contato@ryoki.com.br Esta é a minha profissão, que venho aperfeiçoando dia após dia, procurando sempre melhorar. Meu negócio é escrever livros e, como conseqüência depois de tudo quanto já escrevi e publiquei, julgo-me capaz de fornecer a melhor e mais honesta orientação para um escritor, neófito ou não. E lembro: ninguém nasce sabendo. Até passarinho tem de aprender a voar. Por isso, meu caro escritor, deixe de lado o orgulho e a vaidade e contrate a mão forte e experiente que poderá levá-lo a ter seu trabalho pelo menos visto por um gerente editorial. Daí a ele publicá-lo, são outros quinhentos... Mas sempre é preciso tentar. E tentar da maneira mais viável possível.
Quando conhecemos Ryoki Inoue, para nós era apenas um editor e escritor. Recordista mundial de livros escritos e publicados, mas apenas um editor. Foi assim, que eu o conheci, mais ou menos 11 anos atrás. A vida nos afastou por motivos diversos, e quase esquecemos, um do outro.
Minha lembrança do Ryoki sempre foi uma foto que vi não sei onde, (ou um programa de TV, não sei bem) ele, sentado a uma escrivaninha, com uma máquina de escrever eletrônica, de onde saía uma folha contínua de papel que vinha de uma caixa de formulário contínuo, passava pelo rolo da máquina, e dali, saía o livro. Como uma linha de produção.
À sua frente, havia uma estante, com suas obras... Todas arrumadinhas, um mundo de livros!
Ryoki consegue ser mais que um escritor. Consegue nos passar sentimento, no papo informal, e isso, para quem trabalha com literatura, para quem respira literatura, como é o caso dele, é um dom a mais.
Raramente, um escritor desse porte, tem temperamento fácil. Ryoki não é exceção. Sua mania de perfeição irrita às vezes, mas é para o bem do texto escrito, e para o bem da reputação de quem escreve.
Considero-me, hoje, seu amigo. Mais que isso: procuro aprender, a cada minuto que passo, no micro, com este rabugento senhor das letras.
Conviver com Ryoki é, necessariamente, entrar em seu ritmo. Ou você adora o papo com ele, ou detesta. Não há meio termo!
É um verdadeiro escritor, na essência da palavra.
Ele tem a humildade de receber críticas, mas é feroz e mordaz nas que faz...
Aprendi a entender suas críticas e a aceitá-las, pois nelas sempre vem o ensinamento, a visão da experiência com as letras, com o conhecimento literário e editorial.
Fico honrado com a sua amizade e, mais do que isso, ele honra este nosso Jornal, permitindo-nos entrevistá-lo na informalidade do papo sem compromisso, a não ser um compromisso com o conhecimento deste brasileiro, que o Destino levou para o ramo dos livros e que, com a sua força de vontade, com seu sistema único de organizar o tempo, e racionalizar o trabalho, o fez tornar-se único.



1 ) Ryoki, o que você pensa do mercado editorial brasileiro?
Acho que poderia dizer que é um mercado extremamente cruel. Hoje é assim. Algumas décadas atrás, as coisas eram diferentes, uma vez que existia mais sensibilidade por parte dos editores. Atualmente, a preocupação é o ganho, o lucro. Não se pode condenar esse tipo de pensamento num mundo como o de hoje. Porém, acho que isso está um bocado exagerado... Além do mais, os editores costumam não dizer exatamente a verdade nas entrevistas que dão e, pior, eles têm o péssimo hábito de dourar a pílula que estão vendendo para a opinião pública. Assim, por exemplo, é voz corrente entre os editores que há mais livros publicados de autores nacionais do que de estrangeiros. Isso não é uma verdade perfeita, especialmente se tomarmos os diversos gêneros literários. Assim, no gênero ficção (romances, de um modo geral), os autores brasileiros são minoria. Há muitos mais autores estrangeiros, resultados de negócios realizados “em pacotes” nas grandes feiras internacionais de literatura e mesmo em transações feitas a qualquer tempo, em qualquer lugar deste mundo globalizado. Além disso, as fusões/aquisições de grandes editoras brasileiras por outras estrangeiras – notadamente espanholas, italianas e francesas – fizeram jorrar no mercado editorial tupiniquim uma imensa quantidade de originais “de fora”, cujas qualidade literária e conveniência relativa ao público brasileiro são bastante discutíveis, que ocuparam o espaço editorial que, teoricamente, deveria estar sendo ocupado por autores nacionais. Há quem jogue a culpa desse estado de coisas no próprio leitor brasileiro, dizendo que é idéia comum a todos eles o famoso ditado “santo de casa não faz milagre”. Não é verdade. O grande problema é que o “santo de casa” necessita de marketing, de grande e pesada divulgação e de distribuição adequada. E isso custa dinheiro. Um dinheiro que os editores receiam não ver o famoso ROI (Return Over Investment). O “santo de casa” faria milagre, sim, se para ele acendessem-se a quantidade certa de velas... Porém, só alguns têm esse privilégio. Se procurarmos acompanhar os lançamentos de livros (de ficção, estamos falando desse gênero, não esqueça) no Brasil, veremos que apenas uma ou duas dezenas de autores nacionais são privilegiados e, efetivamente prestigiados pelas editoras ditas “de porte”. Há que se considerar, contudo, um outro fator importantíssimo. A distribuição. E entenda-se, aqui, um aspecto um pouco mais amplo, o que significa que o livreiro, o intermediário imediatamente antes do leitor, está sendo considerado “na mesma panela”. Assim, um autor nacional, a menos que já esteja amplamente consagrado, sempre é recebido pelo distribuidor com o nariz torcido. Ele não pega mais do que algumas poucas dezenas de exemplares e, quando vai apresentar o produto para as livrarias, isso é feito bem depois de uma boa dezena de livros de autores estrangeiros. O resultado é previsível: o livreiro compra estes em primeiro lugar e, se sobrar intenção (leia-se “verba”), no máximo cinco exemplares do nosso conterrâneo serão adquiridos. E sempre em consignação. Essa mesma linha de raciocínio inviabiliza negócios para as editoras menores que, estas sim, têm em seus catálogos muito mais autores brasileiros do que estrangeiros, mesmo porque o acesso dessas editoras a grandes transações editoriais – em Frankfurt, por exemplo – é bem mais complicado. No caso dessas editoras menores, que dependem intrinsecamente de um bom sistema de distribuição para que seus títulos sejam aceitos pelos livreiros e que não possuem sistemas próprios de distribuição e disseminação de seus catálogos, o custo é muito alto, chegando à quase inacreditável marca dos 65% do preço de capa. Dessa maneira, se considerarmos esse números e mais alguns outros – o custo gráfico costuma ser de 20% do preço de capa e os direitos autorais, 10%, sem contar impostos e coisas tais – o que sobra, efetivamente para a pequena editora? Por tudo isso, digo que o mercado editorial brasileiro é cruel. Cruel para todos, talvez com exceção das grandes editoras e das grandes redes de distribuição.

2) Existem falhas graves, a serem corrigidas, no mercado editorial brasileiro?
Evidentemente. Aliás, como em qualquer mercado. Porém, justamente por ser um mercado muito sui generis, o editorial deixa suas falhas mais visíveis, especialmente para os principais fornecedores que são, no resumo da ópera, os escritores. Talvez o principal erro que teria de ser corrigido seja a maneira de pensar dos editores. Essencialmente, a editora existe porque produz livros. E esses livros só poderão ser produzidos se houver autores. Logicamente, isso significa que as editoras precisam dos autores. Contudo, não é o que se percebe... A impressão que qualquer autor brasileiro tem ao se entrevistar com um editor é que este está lhe fazendo um favor imenso em recebê-lo e que é um verdadeiro milagre, motivo de festa regada a uísque e champanhe, quando o original é aceito. Sim, pois isso quando o original consegue chegar às mãos do gerente editorial... Na maioria das vezes, isso não acontece e o trabalho de meses – quando não, anos – de um escritor, vai sumariamente para o lixo sem sequer ter sido lido, ou então é devolvido – também sem ser lido, já vi casos de autores que mandaram os originais propositadamente com as páginas coladas e eles foram devolvidos da mesma maneira – com uma cartinha-padrão dizendo que “apesar da inegável qualidade da obra, não temos vaga para os próximos dois anos”... Ao contrário do que deveria ser, o autor é quem tem a importância menor na escala produtiva de um livro.

3) Há quem diga que quem escreve livros, no Brasil, ou é maluco ou fanático por ter obras inéditas na gaveta. O que você diz disto?
Você esqueceu uma outra característica e, esta sim, muito importante: o vaidoso. E digo que é importante porque é este tipo de escritor que, na realidade, pode ser considerado o grande culpado pelo modo de pensar dos editores, em especial, os “grandes”. Vou tentar justificar... Reclamamos, por exemplo, que os “advanced” pagos – e quando existem – pelas editoras aos autores são muito baixos. E, de fato, o são, especialmente se comparados com aqueles pagos nos Estados Unidos, na França ou na Inglaterra. Da mesma maneira, reclamamos que as prestações de contas sobre os direitos autorais somente são feitas depois de seis meses... e quando são feitas. Em ambos os casos, isso se deve a um hábito que foi implantado nas editoras pelos próprios autores. A imensa maioria dos autores brasileiros não precisam nem mesmo pensar em sobreviver de direitos autorais. Nem ligam para isso. Para eles, basta-lhes saber que sua obra foi aceita, editada e publicada por uma “grande” editora. Ter seu nome no catálogo de uma delas é, para eles, um troféu conquistado, uma comprovação de competência, uma prova de reconhecimento. Na verdade, nada mais do que um alimento para a sua vaidade intelectual. Assim, as editoras acabaram por se acostumar a publicar obras de autores que vêem satisfeita a necessidade de inflar o ego antes mesmo de inflar, nem que seja minimamente, o bolso... Nós, escritores profissionais, aqueles que literalmente vivem da mão para a boca, precisamos de um pouco mais do que isso. Na realidade, precisamos antes de inflar o estômago e, depois, bem depois, o ego. A massagem na vaidade será uma conseqüência e não um motivo primário. Contudo, não acho que seja maluco ou fanático por originais engavetados aquele que decide escrever livros no Brasil. Ou em qualquer parte do mundo. Ser escritor é, no fundo, mais uma profissão e que exige não apenas dedicação, mas muita vontade para continuar a sê-lo. E é preciso que se distinga com bastante clareza algumas subdivisões dentro dessa gama de profissionais. Assim, temos – como você mesmo disse – os “malucos”. Vamos perguntar: malucos, por quê? Pode ser simplesmente porque são iludidos que acham sempre que conseguirão sobreviver só com o que escrevem? Pois acho, sinceramente, que não são tão malucos assim. Eu mesmo sobrevivo do que escrevo... Há, portanto, essa possibilidade. É preciso, no entanto, que se trilhe o caminho certo. É preciso que não se tenha vaidade e, bem ao contrário, é fundamental ter a humildade de deixar que seu texto seja “trabalhado” por um profissional do ramo no sentido de se poder extrair dele o que é realmente bom e “comerciável”, deixando que seja eliminado – ou substituído – aquilo que, no fundo, não passa de elucubração de escritor, por mais que este queira dizer que “justamente isso é a essência” de sua alma. Há outros “malucos” que querem pôr para fora seus fantasmas interiores e esquecem que esses fantasmas são tão interiores que ninguém mais, além do próprio autor, consegue compreendê-los ou, ao menos, interessar-se por eles. A menos que haja um nome e sobrenome de vulto assinando a obra, esta jamais passará além de ser um grande, um imenso “Incômodo”... Já aqueles que você classificou como “fanáticos por obras engavetadas” só estão nessa categoria por dois motivos. Primeiro, porque são tímidos e não têm coragem de chamar um profissional para uma avaliação correta da qualidade de seu texto ou, são excessivamente vaidosos para ouvirem um “não” de um editor. Assim, depois de tudo o que disse – e para não me alongar mais ainda – não posso concordar com quem diz que, o Brasil, o escritor é maluco ou um colecionador de obras engavetadas. Ser escritor é uma profissão e, digo mais, uma profissão nobre e necessária, pois se não fosse pela existência de quem escreve, de quem põe suas idéias e sua produção intelectual a tapa, não haveria a disseminação da cultura, tão necessária para o crescimento dos povos.

4) A que fato, você atribui o não investimento das editoras de renome, em autores desconhecidos? Elas não estariam perdendo um filão de mercado muito promissor?
Uma editora é uma empresa e, num mundo capitalista como o atual – aliás em muitos pontos, capitalista selvagem, ela não pode deixar de pensar que a finalidade última de qualquer empresa é o lucro. O problema está no fato de as empresas-editoras pensarem exclusivamente no lucro máximo. O maior ROI possível. Não podemos condená-las. Mas bem que poderia haver um pensamento mais “light” do ponto de vista financeiro e as editoras pensarem um pouco mais carinhosamente na disseminação da cultura... Se esse pensamento, de fato, existisse, muito lixo estrangeiro deixaria de ser publicado aqui no Brasil e haveria, com certeza, mais espaço editorial para obras de autores tupiniquins que mereceriam estar nas prateleiras das livrarias. E que não estão única e exclusivamente porque elas não são “cartas marcadas”, ou seja, “aposta ganha”. Diga-se de passagem que eu já vi, pessoalmente, com estes olhos que a terra há de comer, editoras “grandes” publicarem obras traduzidas, falsos “best-sellers”, verdadeiros lixos que já passaram, já caíram de podre no exterior muitos anos antes, mas que tinham sido adquiridos por essas editoras e que precisavam ser “desovados”. Então, valia fazer de tudo, inclusive comprar espaço em veículos de comunicação com “matérias-jabá” para divulgar porcaria. E vender. Eu mesmo fui contratado para criticar duas obras desse gênero... Claro, não gostaram das críticas simplesmente porque fui autêntico, verdadeiro, honesto. A filosofia mercantilista do lucro máximo teria de dar ao menos um pouco de lugar para uma filosofia de mercado editorial que propiciasse mais oportunidades para o autor nacional. E não se trata de autor desconhecido... Por incrível que possa parecer, basta o nome ser estrangeiro. Quem conhece o autor de policiais Woodrow McDonald? Ninguém, aposto. Mas ele vendeu nada menos que 15 mil exemplares de seu livro “Piratas do Rio”, enquanto, pela mesma editora, um outro autor, este de nome bem brasileiro – que não vou citar para não criar constrangimentos – não conseguiu vender nem 2 mil... Culpa de quem? Possivelmente do próprio leitor, que acredita mais na qualidade do que escreve um estrangeiro. Então, as editoras praticamente se vêem obrigadas a publicar autores como o McDonald e deixar de publicar um João Ninguém, mesmo que este último tenha uma qualidade literária muito maior do que o primeiro. Uma questão de possibilidade de lucro, que temos de entender, muito embora seja difícil de aceitar. Usando as palavras de Isa Pessoa, na época a responsável pela escolha de autores nacionais para a Editora Objetiva, “Muitos originais chegam aqui num padrão que não é o de publicação. Lá fora, essa peneira inicial já está feita.” Justamente por isso é que reitero o que já disse antes: o autor nacional precisa entender que é fundamental contratar um profissional para preparar sua obra antes de se arriscar a apresentá-la a uma editora. Especialmente se for uma editora daquelas ditas “de porte”. A maioria dos escritores tupiniquins não pensa em comparar – no quesito “apresentação” – a sua obra com a de um concorrente estrangeiro. Esta, já por ter sido negociada de editora para editora ou de agente para editora, ambos os casos uma negociação típica B2B (Business to Business, para os ainda não-iniciados), o material adquirido vem praticamente pronto. Já no caso dos nossos conterrâneos, estes acham que interessa simplesmente o conteúdo, a apresentação do material devendo ser relegada a um segundo plano. Ledo engano, meu amigo! É mais do que evidente que o gerente editorial vai ler com mais boa-vontade um original apresentado corretamente, já devidamente revisado e “copydeskado” do que um outro, ainda cru. Mesmo que o conteúdo deste último seja infinitamente superior, do ponto de vista literário, ao do o9utro,bem arrumado, bem apresentado, com um projeto literário incluído, com sinopse, argumento e estudo dos principais personagens. Mais uma vez, uma questão de custos... E o tempo, sem a menor dúvida, é fator de custo muitíssimo importante. Leva mais tempo analisar um texto cru do que um bem elaborado.

5) As livrarias de pequeno porte, hoje são raridades. Passaram a ser Mega lojas, com livros, e outros atrativos. Isso, não levou a cultura, para um restrito endereço: só as grandes cidades?
Não acho, em primeiro lugar, que a quantidade de livrarias possa ser um termômetro da cultura de um país. Segundo, nada tenho contra as “Megastores” em que se transformaram as livrarias atuais. A tendência é essa: os grandes absorvem os pequenos, num processo de fagocitose que, segundo penso, é irreversível. Pelo menos durante as próximas décadas. Depois, talvez aconteça o retorno ao status quo ante, mesmo porque tudo é cíclico neste mundo. Terceiro, com o advento da Internet, acho que não pode haver a desculpa de não se ter cultura disseminada por todas as partes deste país. Basta um clique e estaremos diante de bibliotecas, de museus e coisas tais. É mais fácil comprar livros via Internet do que ir a uma livraria, enfrentando trânsito, possibilidade de assaltos, etc. Um homem como você, com o seu Anacoluto, é um disseminador de cultura mais importante do que muitas livrarias. E tanto faz o seu leitor estar na casa vizinha à sua, como em São Paulo, Tóquio, Nova Iorque, Manaus, Santarém ou numa aldeia de índios no meio da Amazônia, mas que disponha de acesso à Internet via satélite. As “Megastores” não atrapalham e nem concentram a disseminação da cultura. Pode apostar nisso.

6) Você é, essencialmente, um homem de livros... Um homem de Cultura... O Brasil possui um bom nível cultural, se comparado com Portugal, ou outro país de língua portuguesa?
Creio que são parâmetros completamente diferentes. Portugal é muito mais antigo que o Brasil e o Brasil é mais antigo – como país – do que Angola ou Moçambique. Não dá para comparar. Seria o mesmo que querer comparar um Chablis produzido na Califórnia e um outro, idêntico, produzido na França. Este último terá sempre a diferença de ter nas costas 2 mil anos de civilização. A cultura brasileira é herança da portuguesa. Muitos escritores brasileiros de dois séculos atrás foram extremamente influenciados pelas escolas lusitanas. Muito de nossa cultura, ainda hoje, tem nítidos reflexos da cultura de Portugal. O Brasil tem, sim, um bom nível cultural. Assim como Portugal, Timor Leste, Angola, Moçambique... Mas cada um na sua...

7) Você acredita que ainda exista, no Brasil, espaço para o surgimento de um escritor com potencial internacional, que ainda não foi descoberto por editoras nacionais?
Sim, acredito. E esse surgimento, na verdade, depende quase que única e exclusivamente da boa-vontade e capacidade de negociação das editoras brasileiras quando nas feiras internacionais e mesmo durante o resto do tempo. Teria de haver um pouco mais de “filosofia de venda de autores brasileiros” do que a simples e modorrenta “filosofia de compra de autores estrangeiros”. Precisamos nos libertar do jugo intelectual do hemisfério norte, que diabo! Temos grandes valores, com grandes potenciais de vendas internacionais aqui, além do Paulinho (Paulo Coelho)...

8) Qual o escritor brasileiro, na atualidade, que você destacaria como excepcional?
Já disse. Paulo Coelho, no que pese a crítica não concordar. Paulo Coelho tem um mérito que ninguém pode negar: ele ensinou o brasileiro a comprar livros. Além disso, ele descobriu – e está explorando muitíssimo bem – um nicho literário que é extraordinário em todo o mundo e não apenas no Brasil. O povo gosta de ler Paulo Coelho. Não interessa se ele é profundo – não tem a obrigação de ser – e não interessa o fato de não ser erudito – ele não precisa ser. Aliás, quem vende 45 milhões de exemplares em um ano, não precisa provar coisa nenhuma a ninguém.

9) Na sua opinião, a internet pode se tornar uma grande livraria?
Hoje em dia a Internet já é um dos meios de comunicação e vendas mais importantes do mundo. Todas as médias e grandes livrarias já possuem um sistema de busca e de vendas através da Internet. Outros sites vendem livros, assim como vendem quaisquer outras mercadorias. Portanto, a Internet já é uma grande livraria. E com a vantagem de o cliente não precisar sair de casa ou do escritório para fazer uma compra.

10) Se fosse hoje o dia de começar a escrever seu primeiro livro, você escreveria pensando numa edição em papel, ou numa edição em mídia diferente, como um CD?
Certamente pensaria num CD. E em primeiro lugar porque o CD é muito mais ecologicamente correto. Não é preciso derrubar uma só árvore para se produzir e vender um livro. Segundo, porque estaria livre da escravidão imposta pelas editoras e livrarias. Terceiro porque, para o leitor, ocupa muito menos espaço do que os livros em papel. Quarto, porque o produto final ficaria muito mais barato. Quinto, porque está acontecendo uma tendência mundial – veja-se a última feira de Frankfurt – para as chamadas mídias alternativas e seus surpreendentes aparelhinhos de leitura.

11) Porque pensa que livros em Cd, é o futuro? Isso não fere o comércio editorial de hoje em dia, todo voltado ao papel?
Acho que expliquei na resposta anterior. E acho, também, que os conceitos do comércio editorial voltado para as publicações em papel terão de mudar. Há o aquecimento global, as destruições de florestas, o conceito ecológico, a praticidade, a falta de espaço... Tudo leva ao livro eletrônico. O CD é uma mídia que está sendo pensada e avaliada. Mas outros sistemas surgirão e eu quero estar “fazendo a esteira”...
12) Você é recordista mundial, em livros editados. Isso mudou sua vida, ou o colocou com mais responsabilidades e sem o devido retorno?
Não posso dizer nada a respeito do retorno. Claro que poderia ser muito melhor, especialmente se eu estivesse escrevendo nos Estados Unidos, por exemplo. E talvez se não tivesse sido obrigado a usar meu nome japonês, pois existe, sim, um forte preconceito. Mas esse recorde não mudou minha essencialmente a minha vida. É claro que muitas portas se abrem com mais facilidade, é claro que sou respeitado no meio intelectual... Por outro lado, há muitos pseudo-intelectuais que desprezam, dizendo que quantidade e qualidade são duas coisas que não se casam. Discordo totalmente e já cansei de dizer a essas pessoas que leiam antes de julgar. Mas infelizmente, la critique est facile, mais l’art es difficile. E esses pseudo-críticos, simplesmente não têm a arte...

Sem a menor sombra de dúvida. Com certeza, eu teria feito muita coisa de forma diferente. Teria, por exemplo, procurado um agente literário e um consultor literário. Certamente teria “pastado” menos.

13) Que conselho você daria a um escritor que estivesse querendo ingressar, hoje, no mundo e no mercado editorial brasileiro?
Em primeiro lugar, aconselho-o a levar em consideração que o mundo editorial brasileiro recebe, todos os anos, mais de 40 mil originais de autores iniciantes. Desses, apenas 1% são aproveitados. Portanto, o que o faz pensar que seu original estará dentro dessa porcentagem ínfima? Porém, ele quer entrar nesse mercado... Para isso, é fundamental que:
a. O escritor faça um bom planejamento antes de começar efetivamente a escrever o texto
b. Planeje o texto e a narrativa
c. Planeje e “amarre” bem o enredo e a trama
d. Estude e construa corretamente os personagens, pelo menos os principais
e. Pesquise sobre a época e o local que pretende dar como pano de fundo para a sua trama
f. Escreva gramatical e ortograficamente certo
g. Saiba com exatidão o público-alvo que pretende atingir
h. Saiba qual ou quais editoras têm o perfil necessário e suficiente para aceitar, publicar e distribuir sua obra
Se você tiver dúvidas quanto ao absoluto e perfeito domínio sobre os itens acima enumerados, por favor, contrate um consultor literário. Pode dispor de mim, através do e-mail contato@ryoki.com.br Esta é a minha profissão, que venho aperfeiçoando dia após dia, procurando sempre melhorar. Meu negócio é escrever livros e, como conseqüência depois de tudo quanto já escrevi e publiquei, julgo-me capaz de fornecer a melhor e mais honesta orientação para um escritor, neófito ou não. E lembro: ninguém nasce sabendo. Até passarinho tem de aprender a voar. Por isso, meu caro escritor, deixe de lado o orgulho e a vaidade e contrate a mão forte e experiente que poderá levá-lo a ter seu trabalho pelo menos visto por um gerente editorial. Daí a ele publicá-lo, são outros quinhentos... Mas sempre é preciso tentar. E tentar da maneira mais viável possível.

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